Casa Japão
Onde revivem as memórias
Menção Honrosa no Prêmio AsBEA 2022 na categoria Residências
A cerca de uma hora de São Paulo, esta casa é um retiro em meio ao relevo de Mar de Morros no interior do estado, localizada em condomínio fechado com grandes extensões de mata preservada. Com um terreno de acentuada declividade, o projeto foi pensado de forma a aproveitar da inclinação natural criando uma gradação de intimidade entre os ambientes da casa. Vista da rua, seu acesso supõe uma casa térrea e transparente, e, conforme adentramos seus ambientes, uma sucessão de diferentes relações de escala surpreende, revelando a residência aos poucos.
Projetada para um casal e dois filhos, os 524,33 m² abrigam um programa para o núcleo principal e expandido da família, assim como espaços de lazer próprios de um retiro. Seus três pavimentos distribuem os usos ao longo de cotas adaptadas à topografia em uma implantação em formato de L, pensada a partir do entorno: a fachada mais opaca volta-se a única lateral com vizinhos, retirando a necessidade de muros, em contraponto à transparência em constante relação com o horizonte sinuoso das fachadas internas.
O contraste entre cheios e vazios, a partir do uso dos diferentes pés-direitos e fenestrações de luz, percorre todo o projeto, acentuando a vista para os morros e vegetação circundante, garantindo um ar acolhedor a toda a casa. Esta relação sensível com a entrada do Sol, a projeção da sombra e o limiar entre dentro e fora são fruto de um desejo dos moradores de trazer para a casa sensações e ambiências vividas no Japão, país em que residiram por muitos anos antes de voltarem ao Brasil. Muito aplicável à arquitetura, há na cultura japonesa o conceito de Ma, que pode ser interpretado como “entre”, um intervalo vazio no qual se cria a vida. Escrito em kanji através da combinação entre os símbolos para porta (門) e Sol (日), o Ma (間) é o espaço em que o vazio da arquitetura deve ser pensado a partir das qualidades naturais que o abraçam, inspirando a busca por uma casa que existe, acima de tudo, a partir das sensações despertadas por seus ambientes, sem artifícios de superfície.
Baseando-se neste preceito, a casa foi então desenhada com as sensações guiando a forma, pensando as diferentes qualidades ambientais de acordo. Com os espaços íntimos, como quartos e escritório, correndo na lateral do lote, o volume menos privativo foi desenhado paralelo à rua. Partindo da escala do pedestre na entrada da residência, a sala é o ápice da aplicação da ideia de “espaço entre”, com um pé-direito duplo de 6 metros, provocando surpresa a quem dá rua acredita ver a completude da construção. Com um atravessamento espacial e visual entre o exterior e interior, o ambiente age como uma “varanda” e sala ao mesmo tempo.
Este cuidado espacial se repete em outros momentos, sempre mantendo a ventilação cruzada e iluminação natural em toda a residência. Na circulação, rasgos para entrada de luz na forma de seteiras, revelam discretamente a paisagem, aumentando por contraste o impacto das grandes aberturas de varandas e janelas nos quartos e garantindo a passagem constante do ar. Na cozinha, contígua à sala, o teto mais baixo traz a monumentalidade do pé-direito duplo para a escala do corpo e aninha o ambiente ao trabalhar junto a outros elementos como a laje em balanço do deque e a jardineira suspensa da fachada frontal.
Nos revestimentos mantém-se a valorização do jogo de luzes e da paisagem, usando de cores neutras e elementos filtrantes, como os brises fixos e ripados, que em muito se relacionam tanto com a arquitetura japonesa, de portas shoji translúcidas, como com a brasileira, de cobogós e brises-soleil. Fortalecendo a referência espacial nipônica, estes mesmos elementos de fachada aparecem usando madeira carbonizada tratada com a técnica Shou Sugi Ban. Existente em construções milenares, a técnica de queima superficial da madeira prolonga a vida útil do material.
Por fim, debruçada sobre a paisagem, a casa logo existe para criar e reviver memórias, valorizando o silencio à sua volta e proporcionando um refúgio da vida agitada.
Uso Residencial
Área 524,33m²
Local São Roque - SP
Ano 2020
Status Concluído
Projeto de arquitetura Celso Rayol e Fernando Costa
Coordenadores de projeto André Caterina, Daniel Osório, Lúcia Andrezo, Thiago Godoy e Vanessa Moreira
Equipe Daniel Nardelli, Eduarda Volschan, Júlia de Queiroz, Luiza Loureiro, Mateus Fragoso, Mateus Keiper e Pedro Brito
Fotos Leila Viegas
Paisagismo Salvetti Paisagismo
Construção Machado Freire
Estrutura e fundação Ávilla Engenharia
Instalações mecânicas e prediais Rich Engenharia
Piscina Rich Engenharia
Materiais e equipamentos Soal Esquadrias, Parquet SP, Portobello, Docol, Imóbilies Madeiras